Como funciona a Polícia Federal

 De polícia local a Polícia Federal

Quando a capital do Brasil era o Rio de Janeiro, só lá existia uma polícia diferenciada, e que era responsável pela segurança do Presidente e Ministros e também atuava na área de segurança pública daquele Estado. Era chamada de Polícia do Distrito Federal, a PDF. Em março de 1944, ainda na antiga capital da República, a instituição mudou de nome, passando para Departamento Federal de Segurança Pública – DFSP. Mas a mudança foi só de sigla porque continuava atuando de forma “local”, como qualquer polícia de qualquer estado, ou seja, tendo seus atos e ações, em sua grande maioria limitados ao Rio, investigando lá homicídios, roubos, assaltos e outros crimes, comuns, desde aquela época.


Quer dizer, os crimes que acontecessem em outros Estados eram do competência de cada polícia de cada governo e a DFSP não podia interferir, com exceção de ações que fossem da polícia marítima, aérea e de fronteiras, que desde aquela época eram atribuições exclusivas da DFSP em todo o pais. Só a eles cabia fazer este trabalho seja onde fosse o mar, a fronteira ou o espaço aéreo. Nestas áreas as outras polícias dos Estados não podiam intervir, interferir ou investigar. Só neste ponto a PF (então DFSP) se diferenciava das demais no país.

Suas atividades e atribuições só foram estendidas para todo o território nacional em junho de 1946, mas ainda assim só para investigar alguns casos, em alguns tipos de crimes específicos como o tráfico de entorpecentes (que já começa a ser um problema nacional no país) e crimes contra a fé pública, quando fossem de interesse da Fazenda Nacional. Em 1960, com a mudança da capital federal para Brasília, os órgãos públicos federais dos Poderes da República, incluindo o DFSP, também mudaram para Brasília, que passou a ser o novo distrito federal do país. Só que apenas uma pequena parte dos policiais do DFSP foi para a nova capital da República, ficando no então Estado da Guanabara a maior parte de seu efetivo e seus serviços de segurança pública.

Em 31 de dezembro de 1960, o governo decidiu criar uma escola de polícia, o que aconteceu em 31 de dezembro de 1960, em ato assinado pelo general Osmar Soares Dutra. A idéia era formar policiais e peritos em técnicas policiais avançadas para combater o crime – que crescia rapidamente – e também ter uma escola para que os profissionais - com o passar do tempo - fizessem cursos de aperfeiçoamento e atualização. Assim o DFSP, agora em Brasília, foi reestruturado e buscou-se como modelo, para orientar e treinar os novos alunos, as polícias da Inglaterra, Estados Unidos e Canadá.

A escola de polícia foi chamada de ANP - Academia Nacional de Polícia, e foi inaugurada em 20 de Dezembro de 1961. Para fazer o primeiro curso, foram 200 jovens selecionados de algumas cidades brasileiras: Rio de Janeiro, Recife, Porto Alegre, Salvador, Goiânia e Belo Horizonte.

Durante quase três anos estes policiais do DFSP continuaram atuando de forma local, agora em Brasília. Foi só em 16 de novembro 1964, quando o Brasil já estava sob a ditadura militar, através da Lei 4.483, esses policiais passaram a ter, efetivamente, atuação em todo território nacional, podendo, desde então, atuar em qualquer estado da nação. O nome Polícia Federal só começou a ser usado em 1967, quando mudou de DFSP – Departamento Federal de Segurança Pública para DPF – Departamento de Polícia Federal. 

Diferente de outras polícias (Civil, Militar e Rodoviária), que têm suas ações limitadas aos seus Estados, a Federal pôde investigar, desde então, onde quiser, e quem quiser, incluindo as outras policias, em qualquer localidade, se houver denúncias contra integrantes das corporações.

Wagnas Cabral/O Popular/Agência Estado

A Polícia Federal pode atuar em qualquer lugar do país

As policiais dos Estados ficam encarregadas de fazer o policiamento preventivo dentro do próprio Estado (neste caso a Militar que sai as ruas para patrulhar e a Rodoviária, responsável pelo patrulhamento nas estradas) e pelas investigações de tráfico de drogas, roubos, assaltos, assassinatos,estupros e outros tipos de crimes que sejam praticados dentro de seu próprio território. (Nestes casos, atribuições da Polícia Civil). Ou seja, a polícia do Rio só pode investigar os crimes dos cariocas, a de São Paulo os dos paulistas, a da Bahia dos baianos e assim por diante. A Polícia Federal não, ela pode atuar em qualquer lugar do país. Além disso, a Federal investiga grandes casos como, por exemplo: se um grande traficante internacional está atuando num Estado, a PF, além da polícia local, investiga o caso. Se for um grande assalto, como foi ao Banco Central de Fortaleza (onde bandidos do PCC – Primeiro Comando da Capital fizeram um túnel de 80 metros e levaram R$ 170 milhões) a PF também atua e investiga. Se um político é assassinado a PF também investiga, paralelamente as investigações da polícia civil do Estado onde ele foi morto. 

A Polícia Federal atua ainda nas fronteiras do Brasil com outros países para evitar a entrada de bandidos de fora, carros roubados, drogas e armas. São muitas as atribuições da Polícia Federal e poucos policiais para tanto trabalho, como ainda veremos aqui.

 Hierarquia e atribuições da Polícia Federal

A Direção Geral da Polícia Federal fica em Brasília. Além disso a PF conta com 27 superintendências regionais, 54 delegacias, 12 postos avançados, duas bases fluviais e duas bases terrestres.

As 27 superintendências regionais estão distribuídas, igualmente entre os estados.


O organograma da Polícia Federal é assim:



Algumas atribuições da Polícia Federal

Como dissemos, a PF tem muitas e diferentes atribuições. Para o público comum, em geral ela é vista como uma polícia que combate os grandes traficantes de drogas e fornece passaportes para os que querem viajar. Mas há muito mais do que isso sob os cuidados da PF, uma polícia melhor treinada e mais especializada e que tem equipamentos mais modernos e mais eficazes do que as policiais dos Estados. Além de combater o crime a PF faz trabalhos como emissão de carteiras de identidade para estrangeiros, porte de arma (federal) e, como dissemos acima, emissão de passaportes. Há outras importantes divisões dentro da Polícia Federal como:

Divisão de Controle de Adoções - Também é trabalho da PF supervisionar as entidades que atuam em adoções internacionais de crianças e adolescentes brasileiros, emitindo “certificado de cadastramento” às instituições que fazem este tipo de encaminhamento dos pequeninos brasileiros a serem adotados no exterior. O objetivo é fazer com que exista um cadastro das crianças e adolescentes mandadas para o exterior e que o Brasil possa ter controle sobre estas adoções para que sejam verificados os destinos dos adotados.

Divisão de Produtos Químicos - este setor da Polícia Federal, pouco conhecido do público, tem a atribuição de controlar as empresas que trabalham com produtos químicos e dar a elas a licença de funcionamento. Mês a mês, as empresas têm que enviar a PF a lista do que produziram e para que empresas os produtos foram vendidos. Por que é importante este trabalho? Imagine empresas que produzem acetona, por exemplo, um dos componentes básicos para a fabricação de cocaína. Se não houver controle desta produção e distribuição, teoricamente, a empresa fabricante poderia repassar o produto para traficantes. É claro que existem as “produtoras clandestinas” do produto, que a PF tenta combater, mas ao menos, nas empresas “oficiais” para quem a PF emite licença, um controle é possível.

Divisão de Controle de Segurança Privada - As empresas que trabalham com segurança particular, especialmente as que tem serviços terceirizados em bancos e transportes de valores (aqueles caminhões blindados cheios de dinheiro que os levam para os bancos ou caixas eletrônicos), têm que ter autorização da PF para o trabalho e todos os seus seguranças têm que ter a Carteira Nacional de Vigilante que é fornecida pelo DCSP (Departamento de Controle de Segurança Privada). Os vigias têm que passar por um curso de formação e depois, a cada ano, de reciclagem, sob o comando da PF, para estarem, teoricamente, preparados para a função. O curso inclui treinamento de brigada de incêndio, para qualquer eventualidade. Estes profissionais treinados pela PF não são aqueles vigias que passam na sua rua, em motos 125 CC e apitando a noite inteira, e sem nenhum treino para a função. São vigilantes que irão trabalhar em locais onde o dinheiro roda constantemente como bancos, instituições financeiras, grande empresas.... Por que é importante? Imagine você estar em um banco e acontecer um assalto... Quanto maior o preparo dos vigilantes maior a chance de controle da situação, seja impedindo a ação, seja, na impossibilidade de impedi-la, agir com prudência para que funcionários e clientes, além deles próprios, saiam da situação com tranqüilidade e, principalmente, com vida.

Divisão de Emissão de Passaportes

Os brasileiros que querem viajar para o exterior dependem da Polícia Federal para que seus passaportes sejam expedidos. Além de ter que preencher uma ficha, pagar uma taxa e apresentar os documentos de praxe ( RG e CPF), o cidadão tem que estar em dia com o Imposto de Renda. Se estiver irregular o documento não é expedido e sem ele, nada de viagem para fora do Brasil. Em situações normais o passaporte é expedido com brevidade, não ultrapassando dez dias para estar pronto, mas algumas ocasiões, brasileiros tiveram dificuldades para obter o documento porque os policiais da PF, reivindicando melhores salários, fizeram “greve branca” (trabalhar com mais lentidão, olhar mala por na nos aeroportos, etc) e o prazo para a confecção do passaporte chegou a ser de dois meses, irritando muita gente e fazendo outras perder viagens de férias ou negócios.

Esta Divisão da PF tem uma sub-divisão que cuida da documentação de estrangeiros. Quando o estrangeiro chega aqui só para passar uns dias de férias, ele apresenta o passaporte de seu pais de origem e fica liberado para permanecer no Brasil durante o tempo determinado pelo seu visto. Mas se o estrangeiro vem para morar no Brasil, ele tem que passar por este departamento que vai fazer um levantamento da vida dele para saber se não se trata de um traficante ou um bandido internacional. Se tudo estiver certo, ele recebe então uma “carteira de identidade de estrangeiro” e com ela pode ficar morando no país e, se desejar, depois de cinco anos morando aqui pode pedir para ser naturalizado, ou seja, para ser “brasileiro” e ter os mesmos direitos de todos nós, da terra pátria.

É claro que o rigor da PF nem sempre é total e muitas estrangeiros bandidos já entraram por nossos portos e aeroportos, apresentando documentos e passaporte falso, que não foram detectados pela PF. Aqui até mafiosos italianos da “Cosa Nostra” viveram feliz e em paz durante anos e só foram pegos porque alguém os denunciou.

Além dessas atribuições, a PF atua como fiscalizadora nas fronteiras brasileiras e nos aeroportos, tanto para autorizar a entrada de estrangeiros no país, quanto na questão do contrabando ou drogas ilícitas. A PF também atua em conjunto com o Exército na fiscalização ambiental das unidades de conservação e reservas indígenas.

A PF no combate a outros crimes

O combate ao tráfico de drogas é a primeira coisa que vem a mente quando se fala de PF. É verdade. Com o crescimento do tráfico de cocaína, maconha e outras drogas, a Polícia Federal do Brasil tem muito trabalho neste sentido. Mas há ainda outros departamentos que cuidam de outros crimes, igualmente importantes no dia-a-dia dos brasileiros, e que direta ou indiretamente, está presente na vida de todos nós:

Crimes contra o INSS - Cabe à PF investigar tudo o que se relaciona as falcatruas que envolvem o Instituto Nacional de Seguridade Social e são muitas e feitas de várias formas. Neste Departamento há dois tipos de investigações: a que envolve os “tubarões” e as que dizem respeito aos “peixinhos”. As investigações contra os temíveis tubarões são aquelas em que quadrilhas conseguem entrar no sistema do Previdência Social e fazer operações com lucros milionários, indo direto ao “coração” do sistema, alterando dados, transformando, por exemplo, vivos em mortos (e recebendo as aposentadorias e direitos) e que causam os maiores “rombos” no INSS, que está sempre no vermelho (mais saída de dinheiro do que entrada) porque há muitos “roubando”. Há uma máfia que atua (sempre com o apoio de funcionários do próprio INSS) que a PF tenta combater mas que é muito grande e dentro de um sistema que, parece, é muito fácil de burlar. Quando a PF prende uma quadrilha, outras continuam em ação. Elas são formada por bandidos, médicos peritos e funcionários burocráticos do INSS e dão muito prejuízo, por exemplo, indicando as pessoas que não tem nenhum tipo de doença mas conseguem se aposentar, com valores bem altos. No esquema a pessoa ganha a aposentadoria indevida (já que não é doente) e paga uma parte do que recebe aos “médicos” e funcionários corruptos do sistema.

A possibilidade de aposentados fazerem empréstimos consignados (com desconto na folha de pagamento) também trouxe a PF mais uma dor de cabeça e trabalho. Mais uma vez, contando com funcionários de dentro do INSS, eles conseguem fazer “empréstimos” em nome dos aposentados, sem que os próprios aposentados saibam que seus nomes estão sendo e que estão sendo lesados. Bandidos profissionais, com a ajuda de funcionários do INSS, fazem um levantamento dos valores recebidos pelos aposentados e qual a quantidade que eles podem pedir de empréstimo. Entram no sistema do INSS e fazem o empréstimo em nome do aposentado sem que ele saiba. Levam toda a grana (de R$ 2 mil a R$ 30 mil) e quando o aposentado vai receber seus vencimentos, percebe que há um desconto de um empréstimo que ele não fez. É o golpe mais comum entre os “peixinhos” e que tem dando muito trabalho a PF, que, mesmo depois de muito tempo de investigação, não conseguiu desmontar em definitivo o esquema das quadrilhas até o início de 2008. Muitas foram presas, mas o esquema continua.

Desvio de Verbas Públicas - A PF tem um departamento, constituído de delegados e investigadores, para investigar – quando solicitada – os desvios de verbas públicas, destinadas a obras e melhorias para a população e que acabam desviadas para os bolsos de governadores, prefeitos e funcionários públicos. Um departamento que tem tido muito trabalho nos últimos anos porque as denúncias de apropriação indevida do dinheiro do povo são muitas e muito freqüentes. 

Crimes Financeiros - Também está de olho a PF nos crimes como sonegação de imposto de renda, compras sem notas fiscais ou com notas fiscais falsas e importações ilegais .

Dinheiro Falso - todos os anos são milhares de reais falsificados pelos bandidos e jogados na praça. Eles “copiam” as notas oficiais de forma tão parecida com as verdadeiras que a gente, ao receber as notas, não consegue perceber a diferença da falsa e do real. Quadrilhas especializadas em fazer dinheiro falso conseguem até fazê-las circular em bancos e caixas eletrônicos, de maneira que você, ao retirar dinheiro, sem saber pode estar pegando uma nota falsa. A PF tem, em Brasília, um departamento especial, com técnicos e especialistas que podem identificar as notas falsas e as verdadeiras. Usam equipamentos especiais, super modernos, que através de luzes conseguem mostrar se o dinheiro foi feito pelo Banco Central (verdadeiro) ou copiado pelos bandidos (falsa moeda). A incidência de uma luz especial sobre a nota mostra o tipo de papel em que foi impressa e se nela tem a marca d”água ou não. 

Jogos Ilegais - Cabe aos policiais dos Estados não permitir que jogos não permitidos aconteçam, como bingos irregulares, jogo do bicho, pôquer com cobrança de dinheiro para poder entrar no jogo; cassinos onde as pessoas apostam em todo tipo de jogo de cartas ou em roletas, máquinas de azar e outros jogos. A PF também investiga estes tipos de jogos e muitas foram as vezes em que “estouraram” estas casas, surpreendentemente, encontrando até policiais estaduais participando dos jogos.

Crackers - Ao contrário dos hackers convencionais, que estudam protocolos de rede, telefonia e sistemas operacionais, e dos kiddies, que buscam obter fama por causar transtornos a websites e serviços, os crackers se distinguem de todo o resto por se focarem em como funcionam os programas de computador. São os responsáveis pela criação dos cracks, ferramentas que quebram a ativação de um software comercial, permitindo que qualquer pessoa tenha uma versão pirata do software em seu computador. Há vários tipos de hackers: white hats, black hats, script kiddies, crackers e phreakers, mas apenas os black hats e os script kiddies costumam burlar a segurança dos computadores e provocar prejuízos comerciais deliberadamente.

A PF tem um departamento especial, com policiais especialistas em computadores e internet, para monitor e descobrir estes “ratos” do computador que se especializaram em entrar em contas bancárias e cartões de crédito e roubar dinheiro de contas bancárias, fazendo transferências bancárias já que conseguem roubar senhas e dados dos clientes de bancos. A mesma técnica eles utilizam para copiar dados de cartões de crédito e passam a fazer compras em seu nome sem que você saiba. Só quando o extrato de sua conta for acessado é que você vai descobrir que uma quadrilha clonou (copiou) seus dados.

Outros crimes - No ano de 2007 agentes da Polícia Federal, usando seus tradicionais uniformes negros, com colete também preto, escrito em amarelo “Polícia Federal”, invadiram o Fashion Week de São Paulo. Portavam armas pesadas e tinham uma ordem a ser cumprida: impedir que duas garotas menores (uma de 14 e uma de 16) participassem do desfile. O Fashion Week acontece há alguns anos e é um dos mais importantes eventos de moda do país. Uma das “grifes” participantes do desfile, a Lourenzo Merlino, escolheu as duas modelos que iriam desfilar na passarela. Iriam porque a PF – que tem competência até para este tipo de ação – decidiu impedir que as menores desfilassem. Não só para combater o uso de crianças e adolescentes pela indústria da moda mas por causa dos crescentes casos de aneroxia entre meninas de 12 a 17 anos, que deixam de comer para ficarem muito magras e conseguirem espaço em desfiles, já que os costureiros das grandes marcas só querem mulheres magérrimas para desfilar seus modelitos.

 A PF e combate a armas, drogas e contrabando

O combate ao tráfico de drogas é uma das principais missões da PF, que atua em todos os aeroportos internacionais do Brasil, na tentativa de barrar a entrada e o envio de drogas, especialmente cocaína.

No combate ao tráfico internacional de drogas a PF também tem 39 postos marítimos e 22 fluviais. Podem ser postos fixos ou “móveis”, já que em barcos, os policiais circulam pelo mar ou rios em busca de traficantes que tentam fazer a droga entrar no Brasil (ao sair dele) usando nossos rios e mares como caminho e rota. Também ficam de olho em traficantes de armas e contrabandistas.

Agência Estado

Policial federal durante e a apreensão de drogas

Outro trabalho da PF é ficar nas fronteiras do Brasil com outros países e fazer a fiscalização terrestre. Há postos nas fronteiras com o Peru, Bolívia, Colômbia, Guiana Francesa, Venezuela, Paraguai, Argentina e Uruguai. Um serviço nada fácil porque lidam com bandidos perigosos, grandes e ricos traficantes. Um delegado que atua em Foz do Iguaçu, e que prefere não ter seu nome divulgado, disse ao HSW que o maior problema é o pequeno número de policiais que ficam de plantão nestes postos. “Precisa de mais policiais para fazer este trabalho nas fronteiras. Acredite: às vezes ficam dois ou três policiais, que, na verdade nada podem fazer. Às vezes, passam dois ou três caminhões com vários homens e a gente até sabe que são bandidos e que podem estar com os baús dos veículos cheios de armas ou drogas. Mas o que fazer? Mandar parar é certeza de levar tiro... se fôssemos em maior número tudo bem interceptá-los. Mas dois ou três investigadores nada podem fazer numa situação dessa a não ser deixar o veículo passar e ir embora”

Muitos carregamentos são interceptados nas estradas brasileiras, depois de investigações da polícia ou de denúncias anônimas que informam que o motorista está transportando drogas. Elas vêm em geral, sob mercadorias como abacaxi, arroz, feijão. São motoristas que aceitam, por um bom dinheiro “extra” transportar maconha e cocaína para os traficantes. Às vezes, se saem bem e conseguem levar as drogas ao destino, outras, aprendem que dinheiro rápido e fácil pode levar à cadeia. A Polícia Federal de São Paulo já fez apreensões, em caminhões, que levavam toneladas de entorpecentes.

Aurea Cunha/Gazeta do Povo/Agência Estado

Policiais federais na fronteira do Brasil com Paraguai

Operações especiais

Uma das características da Polícia Federal nos últimos anos é preparar grandes operações, que envolvem centenas de policiais e que muitas vezes são feitas simultaneamente em vários Estados brasileiros. Com mandados de prisão que vão de 20 até 70 pessoas (como já aconteceu em muitas desta operações da PF), eles invadem residências e escritórios dos acusados e supostos envolvidos e fazem as prisões. Em geral, estas ações são feitas entre três e cinco horas da manhã, para pegar o suspeito de surpresa. De pijamas, os suspeitos são acordados e detidos. Para muitos são ações que devem continuar sendo feitas porque, em geral, pegam importantes integrantes dos esquemas e não só os “peixinhos miúdos”. Para outros, é um gasto inútil porque a maioria dos detidos acaba sendo liberados pela Justiça. 

São operações caras, que envolvem muita gente, viaturas, combustível, serviço de inteligência – com escutas telefônicas e gravações. Todas as operações recebem um “nome”.

Em fevereiro de 2008, por exemplo, a PF fez a operação Fariseu e desmontou um esquema de corrupção que envolvia emissão de títulos de filantropia a escolas, faculdades e hospitais. Se uma entidade é considerada “filantrópica” ela consegue vantagens fiscais que as livram de pagar muitos impostos ao governo (às vezes, dependendo do caso deixa de pagar milhões já que, filantrópica, estaria ajudando doentes, cegos, estudantes necessitados). No caso os detidos “vendiam” certificados de filantropia a entidades que não preenchiam os requisitos de uma empresa filantrópica.

As entidades compravam os títulos, se beneficiam deixando de pagar impostos e é claro, pagavam uma parte a quadrilha que conseguia os títulos de “entidade filantrópica” Para chegar aos culpados e prendê-los a PF levou quatro anos investigando a quadrilha. 

Como a Operação Fariseu, a PF já fez muitas outras: de 2003 a 2008 foram mais de 350. Ações que foram “batizadas” pela PF, às vezes até com nomes esquisitos: Concha Branca, Medusa, Tempestade no Oeste, Pardal, Farol da Colina, Poeira no Asfalto, Catuaba, Predador, Big Brother, Tango, Cevada, Veneno, Dragão, Curupira, Roupa Suja, Terra Limpa, Firula, Mandrake, Sanguessuga e outras dezenas de nomes escolhidos em cada operação.

Nelas foram dezenas as falcatruas descobertas. Quadrilhas ligadas ao tráfico nacional e internacional de drogas foram desmanteladas, outras eram ligadas a contrabando ilegal de madeira e de cigarros. Bandidos ligados à clonagem de veículos, outros que falsificavam leite em pó. Prendeu pessoas que desviavam dinheiro de obras públicas, que cometiam crimes ambientais e outras que até mandaram matar. Até uma quadrilha que vendia sentenças judiciais foi desmantelada numa das mais importante operações já feitas, a Anaconda, quando foi preso o juiz João Carlos da Rocha Mattos. A acusação da PF foi que, por dinheiro, a quadrilha dava um “jeitinho” de diminuir em muito a pena do bandido.

Um levantamento recente mostrou que com estas operações a PF acabou com organizações criminosas que movimentaram mais de R$ 50 bilhões, fazendo o pais perder (portanto nós perdermos) cerca de 18 bilhões de dólares em sonegação fiscal e desvio de dinheiro. De 2003 a 2007, nestas ações a PF prendeu 3.712 pessoas, das quais 1.098 eram servidores públicos.

Tiago Queiroz/Agência Estado

O juiz João Carlos da Rocha Matos escoltado pela PF

Mais do que nunca a Polícia Federal trabalhou muito e mandou para trás das grades não só os pequenos, os peões” do esquema, mas sim empresários, policiais civis, advogados, juízes, fiscais, policiais rodoviários, auditores fiscais do trabalho, vereadores, funcionários do INSS, e até mesmo policiais federais envolvidos com corrupção (como um que foi preso em Rondônia acusado de extração ilegal de diamantes), mostrando que não há corporativismo e se a acusação for contra um policial da própria PF, ele será investigado e preso se for culpado. Entre os detidos, no total, foram 107 integrantes (agentes e delegados) da própria polícia federal. Se prendeu tanta gente, evitou a continuidade de muitas quadrilhas e muitos esquemas corruptos, porque a Polícia Federal é criticada em relação as operações que faz?

Muito alarde, mas pouca gente na cadeia. As leis penais são frágeis.

Investigar, cumprir os mandados e prender tanta gente (mais de 3 mil) não quer dizer que todas essas pessoas continuaram presas. Das 3.712 pessoas presas em 216 ações da Polícia Federal de 2003 a 2006, apenas 432 foram condenadas e, efetivamente, 265 ficaram presas. O levantamento foi feito pela Revista Época, a quem o diretor da PF, Luiz Fernando Corrêa, em fevereiro de 2008, declarou: “rompemos com a inércia do imaginário do cidadão. Hoje todos estão conscientes de que podem ser alcançados pelo Estado”. É verdade: a polícia partiu pra cima de poderosos, como a população não estava acostumada a ver. De rosto coberto, escondendo a cara sob as próprias camisas ou paletós, empresários, juizes, fiscais, policiais, foram gravados pelas câmeras de emissoras de TVs e máquinas fotográficas dos principais jornais do pais. Mas, na fase seguinte, a da “condenação” a coisa muda. Poucos são condenados a penas duras e sérias, na verdade poucos foram condenados, o que mostra uma falha na justiça ou confirma o que muitos brasileiros pensam: prender os mais poderosos agora até prendem, mas eles são realmente condenados e realmente ficam atrás das grades?

“A Justiça não trabalha com rapidez e se o preso tiver status, dinheiro e poder, como é a maioria dos que prendemos neste últimos anos, a Justiça fica mais lenta, mais cega, muda e surda” diz um importante delegado da PF em São Paulo. “Um “zé-mané-qualquer” leva logo de 8 a 15 anos de prisão por qualquer razão, e sem dinheiro para se defender é condenado, muitas vezes, sem sequer entender o processo. Mas os “poderosos” que a PF tem prendido nos últimos quatro anos, especialmente, não. Roubaram, traficaram, meteram a mão no dinheiro do povo, o suficiente para poder pagar advogados caríssimos (que para mim é outra máfia, ressalta o delegado), que acabam protelando (adiando) tanto a história e o processo que o sujeito, que provamos até por escutas telefônicas, que era culpado, fica em casa esperando o resultado, que vai sendo adiado e adiado e adiado pela justiça até que o “poderoso” se livra do processo e nunca vai preso”. O desabafo é de um delegado da Polícia Federal de São Paulo, que há 25 anos dedica sua vida e carreira ao combate ao crime. Já foi investigador e foi a luta para se tornar delegado, carreira que exerce há 11 anos. Já fez parte de várias das operações da PF e dispara suas farpas: “nós investigamos, gravamos, provamos... E a Justiça “senta” em cima de tudo isso e favorece os poderosos que prendemos. Ficam na cadeia os peixes pequenos. Os grandes são liberados pelos juízes e continuam impunes, voltando ao crime pelo qual nós os prendemos, depois de horas, meses, anos de investigação”. O delegado que falou com a HSW, em março de 2008, preferiu não se identificar. “Veja você: se em nossas operações – muitas vezes injustamente criticadas, até juízes nos prendemos, como acreditar na Justiça? Nesta hora deixo de ser delegado, e me sinto como qualquer cidadão: frustrado e me sentindo impotente”.

A PF está acima de tudo?

Os 107 integrantes da própria Polícia Federal presos nas Operações realizadas pela entidade já respondem a pergunta. Não, a PF não está acima de tudo e entre seus próprios pares, muitos são corruptos e bandidos, se aliando a quadrilhas de traficantes. Os salários baixos, como sempre alegam os policiais corruptos, no caso da PF não são tão baixos, especialmente se comparados ao mínimo salário do País. Em março de 2008, o salário mensal inicial de um delegado da PF era R$ 12.900 e de um investigador de R$ 5.700. 

Das operações e mega-operações e seus estranhos e diferenciados nomes dados pela PF, uma das principais críticas é a questão dos “holofotes” da imprensa. A cada Operação, já previamente marcada, a PF avisa jornalistas e “arma” um esquema para que eles estejam presentes nas ações, que como já dissemos, ocorrem, em sua maioria, durante a madrugada. Jornalistas das principais Tvs, rádios e jornais são avisados antecipadamente e sempre estão com suas câmeras no lugar e hora marcadas e registram as invasões a residências e aos escritórios, mostrando as prisões e apreensões de documentos e computadores que são levados para a perícia técnica da PF. 

As imagens mostradas ao público são de policias fortemente armados levando para suas viaturas os suspeitos presos, computadores apreendidos, enormes pastas com documentos. São muitas as críticas a este esquema que a PF sempre monta depois de dias, meses ou anos de investigação: chamar a imprensa para, na calada da madrugada, sob “flaxes” de máquinas fotográficas, registro das câmeras de cinegrafistas e microfones de vários repórteres, mostrar abertamente o trabalho sigiloso de tanto tempo. O que querem? Aparecer? “Como mostrar ao público, ao povo que estamos mesmo trabalhando para mandar para a cadeia os colarinhos brancos? Como provar para a população que depois de tanto tempo de investigação e uso do dinheiro público a gente chegou lá e prendeu do chefe ao motorista? Tudo bem, a realidade mostra que o judiciário acaba mantendo o motorista preso e o chefe vai embora, livre. Mas o que fazemos enquanto polícia? Desistir? Nunca!”, diz um delegado da Polícia Federal.

 Para ser um policial federal

Para ingressar na Polícia Federal, o candidato deve ter curso superior (desde 2001 é obrigatório ter faculdade para concorrer a qualquer cargo, seja de investigador ou delegado) e prestar um concurso público. Há exames escritos e oral, além de teste de resistência física. A concorrência é grande, já que os salários são altos em comparação com a média brasileira. Em março de 2008, o salário mensal inicial de um delegado da PF era R$ 12.900 e de um investigador de R$ 5.700. 

Aprovado, ele tem que fazer um curso na ANP – Academia Nacional de Polícia, uma escola que foi inaugurada em 20 de fevereiro de 1979, que fica em Brasília, numa área de 600 mil metros quadrados. Lá o aluno faz diversos tipos de cursos. O aluno adquire conhecimento sobre a atividade policial, manuseio e uso com destreza e segurança de armas de fogo e passa também por mais um rigoroso preparo intelectual, psicológico e físico. Curso de armamento e tiro (inclusive com fuzis), treinamento com veículos em direção defensiva, cursos de segurança de autoridades (onde aprendem como fazer escoltas) e operações táticas, onde aprendem a invadir locais de crimes. 

No curso de educação física, aprendem técnicas de defesa e ataque em uma ação. Também faz parte do curso a aprendizagem de informática, com equipamentos de última geração; laboratório de perícia onde, com equipamentos moderníssimos aprende como periciar um local de crime . É um curso onde o aluno tem que treinar muito durante quatro meses e com o risco de não ser admitido no final, porque pode ser desligado por falta de aproveitamento das matérias.

Os policiais federais acabam depois atuando em várias áreas do país e em diversos departamentos assim que entram. Uma prática comum para conhecer a instituição e também ver aonde o profissional melhor se adapta.

Gazeta de Caaporã

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